sexta-feira, 22 de abril de 2011

E agora o que é que eu faço?

Nós falamos em verso

Eis uma autêntica pérola, do melhor que tenho ouvido, para que ninguém nunca mais se atreva a dizer que a língua portuguesa não é para ser cantada. Senhoras e senhores, Pedro d'Orey:

segunda-feira, 4 de abril de 2011

A princesa de Clèves cometeu um erro ...proustiano

A promessa dada ao marido em vida ganha as trágicas proporções de um delírio de orgulho quando a princesa de Clèves decide cumpri-la para com um morto, obedecendo a uma lei que só existia na sua mente escrupulosa. M. de Clèves não estava no direito de lhe exigir que recusasse o duque de Nemours depois da sua morte, nem ela de cumprir tal desejo, em memória de um defunto, contra o amor que sentia por um homem vivo.
Um erro com sabor a Proust: embriagado pela dança de cemitério com a visão da avó, o narrador de mestre Marcel receia tudo o que possa transformá-lo numa pessoa diferente daquela que a avó conhecera, desejaria ser ele próprio cadáver petrificado, coluna de sal com o olhar para sempre fixo na avó defunta de um passado morto, teme que o pulsar indomável e imprevisível da vida - sejam a alegria de um simples passeio num dia de Primavera, ou o desejo físico pelo corpo vivo de Albertine - ameace a quietude do culto idólatra do "regret pour nos morts" e de "ce qu'ils ont aimé".
Mas tal como a avó do narrador, que lhe tornava possível o sexo seguro, previsível, de um incesto de infantil candura, não passava de "un simple écho de mes paroles" e "le reflet de ma propre pensée", assim também a regra que levou a princesa de Clèves a fechar-se numa torre muralhada longe dos olhos do duque de Nemours não era mais do que a sombra fantasma do marido que tinha enterrado. Madame de Clèves cometeu o engano fatal de se impor uma perfeição mais perfeita que a de Deus ele próprio. Levando ao extremo este erro, encerrou-se num convento, uma decisão que não podia ser mais contrária ao amor, assim duplamente atraiçoado - não se entra para um convento para fugir do amor, mas para ir ao encontro dele, quando o amor que arrebatou um coração está vivo dentro duma cela e o seu chamamento é irresistível (que o diga Thérèse Martin e tantas outras).
Foi de profunda sabedoria aquilo que disse M. de Nemours à princesa de Clèves: "Vous seule vous opposez à mon bonheur; vous seule vous imposez une loi que la vertu et la raison ne vous sauraient imposer". Seria ainda mais acertado dizer: "Vous seule vous opposez à notre bonheur".

La Princesse de Clèves (1961)




La Princesse de Clèves (1961)
Réalisation: Jean Delannoy
Acteurs principaux: Marina Vlady (princesse de Clèves), Jean-François Poron (duc de Nemours), Jean Marais (prince de Clèves)
Scénario: Jean Cocteau & Jean Delannoy
Musique:Georges Auric
Décors:René Renoux
Costumes: Pierre Cardin & Marcel Escoffier
Photographie: Henri Alekan
Montage: Henri Taverna
Production: Robert Dorfmann
Sociétés de production : Silver Films (France), Enalpa Film (Italie), Produzioni Cinematografiche Mediterranee (Italie)