terça-feira, 29 de maio de 2012

haja paz

Tece impacientemente
Não como o tecelão,
que tem o tempo que tem o mundo,
mas tece
também longamente.
Ansiosamente, porém.

Receosa,
de si desorientada,
abalada
nos fundamentos.
Tece teimosamente.

Sem raízes, sem prazer.
Como por castigo,
isolada
no degredo.

Aprendeu a gostar deste silêncio,
como quem se afeiçoou
às paredes de um jazigo,
anos depois
de se ter fechado
nelas.

Assaltada pelo medo,
única intimidade,
entregou-se à vertigem,
proprietária daquela sorte,
porque teima nela.

Enche de ecos surdos
o vazio
onde chama luz à penumbra.
Questão de hábito.

Tece um casulo.
E dali não sairá.
Porque ninguém percebeu
que só à força
se arranca à morte um morto.
De respeitos humanos estão as morgues cheias.
Para descanso dos hipócritas e cobardes.

domingo, 27 de maio de 2012

sem pouso

Cercou-se e encerrou-se. Atranvancou-se. Deixou um pequeno orifício para espreitar. Mas assustou-se, com o sopro do seu próprio respirar. Consumiu-a a ansiedade, pobre. E correu a procurar tudo o que tinha em redor, para de tudo fazer defesas, espinhos, carapaça, paus e ferros, armas do fogo que lhe queima a alma. Endureceu, toda ela crispação e medos. Até que, cansada (muito cansada), decidiu fingir-se morta.

E estaria bem, acreditou, se a deixassem assim morrer, sem a chamarem pelo nome, de volta à vida. Coisa irritante, ofensa suprema, desrespeito - agora que estava já meio-morta.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

miudezas

Acusar os outros de falhas que sabemos nossas, é fraqueza humana compreensível. Acontece aos melhores. Conta é aquilo que fazemos depois de cair em si. O que distingue uma pessoa honesta da gente pequena, é ousar reconhecer. A escolha do batoteiro é transvestir a cobardia em coragem, transformando-a em terrorismo.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Não que não queira

Diz que não. Nem sequer porque não desejasse. Tem é receio de não conseguir. A inquietação que lhe vem desta insegurança, basta para lhe bloquear o desejo. O outro lado da margem torna-se mais distante com cada experiência abortada. Esboroada a confiança, resta-lhe, como única certeza, a crença na fatalidade do fracasso.